Comida de qualidade e em quantidade adequada para os mais de 11 mil reeducados de todos os presídios de Mato Grosso. A solução para o problema histórico do estado foi apontada em mesa técnica aprovada pelo Plenário do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT), na sessão ordinária desta terça-feira (26). Proposta pelo conselheiro Sérgio Ricardo, a mesa técnica apresenta um novo modelo de contratação de restaurantes para atender o sistema carcerário estadual, garantindo dignidade e humanidade ao processo de ressocialização.
Em Plenário, Sérgio Ricardo chamou a atenção para a urgência do tema. “Garantir alimentação adequada nas prisões é essencial em termos de responsabilidade social e legal, na medida em que não apenas assegura os direitos humanos dos reeducandos, como também contribui para uma melhor reabilitação e reintegração na sociedade após o cumprimento das penas.”
A partir de agora, as licitações do estado devem privilegiar a pré-qualificação das empresas antes da fase de lances, afastando aquelas que apresentem baixa qualificação técnica ou capacidade financeira limitada. Aspectos como o aperfeiçoamento das técnicas de formação dos preços referenciais e a instalação de cozinhas em unidades prisionais de grande porte também fazem parte do modelo proposto.
Durante a sessão ordinária, o presidente do TCE-MT, conselheiro José Carlos Novelli, pontuou que a situação é crítica e de longa data, o que faz do resultado um momento histórico. “Parabenizo a todos os conselheiros que participaram dessa mesa. Hoje o Tribunal resolve um problema social da mais elevada importância para quem respeita os direitos humanos, que são fundamentais.”
Estratégias para reintegração e redução da reincidência criminal também foram observadas pelo relator. De acordo com Sérgio Ricardo, além do aumento na fiscalização e controle sobre o trânsito de pessoas, veículos e materiais, os futuros refeitórios contarão com mão-de-obra dos recuperandos, o que assegura oportunidade de capacitação e remuneração.
A proposta do conselheiro surgiu após reunião com supervisor do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMF) do Tribunal de Justiça (TJMT), desembargador Orlando Perri, na qual recebeu uma série de denúncias sobre as condições precárias de alimentação nas penitenciárias do estado, sobretudo em Cuiabá e Várzea Grande.
Alta complexidade
Concluída no dia 23 de agosto, esta é a mesa técnica que levou mais tempo para apontar um resultado: foram seis meses de trabalho conduzido pela Comissão Permanente de Normas e Jurisprudência (CPNJur) e pela Secretaria de Normas e Jurisprudência (SNJur). Foi o que destacou o presidente da Comissão, conselheiro Valter Albano, ao explicar que o procedimento envolveu quase todos os gabinetes da Corte de Contas.
“Foi uma mesa de difícil construção. Ouvimos tudo o que tinha que se ouvir no estado e especialistas Brasil afora, para chegarmos àquilo que é o melhor possível neste momento histórico. Esse modelo vai transformar profundamente o setor, então, devemos sim ficar muito orgulhosos pelo trabalho que esse Tribunal realizou sob a liderança do nosso presidente, que nos deu autoridade para fazer a discussão”, afirmou.
No total, 12 reuniões contaram com contribuições de diversas instituições, como Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), Ministério Público Estadual (MPMT), Ministério Público de Contas (MPC), Defensoria Pública do Estado (DPE-MT), Procuradoria Geral do Estado (PGE), Controladoria Geral do Estado (CGE), Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp-MT), dentre outras.
Questão histórica
Homologada com unanimidade do Plenário, a mesa resolveu uma questão que se arrasta por anos em Mato Grosso, onde as contratações sempre privilegiaram o menor preço, em detrimento da capacidade de atendimento. Os prejuízos disso incluem a incapacidade das empresas vencedoras de executar o serviço e a subcontratação, o que resulta na falta de condições e insumos necessários à produção das refeições.
Relator das contas da Sesp-MT do biênio 2021/2022, Sérgio Ricardo apontou os diversos conflitos resultantes desse cenário. “Tramitam diversos procedimentos autônomos questionando a mesma matéria, não existindo até então uma regra uniforme sobre a melhor forma de contratação. Esta é mais uma contribuição do Tribunal para a gestão pública, para os próximos processos licitatórios”, pontuou.
A situação foi exemplificada pelo conselheiro Antonio Joaquim, que lembrou ter suspendido um destes processos licitatórios por meio de medida cautelar. “O governo não conseguia fazer a licitação e pagava por meio de indenização ou aditivos e a coisa ia andando de forma desgovernada, porque o [critério] do menor preço nunca ia funcionar. Isso é solução, estamos sendo úteis à sociedade.”
Ao relacionar o tema a outros problemas de segurança pública, Novelli lembrou que a legislação prevê que o Estado forneça cinco refeições diárias nas unidades prisionais, contudo, apenas três têm sido oferecidas. “Inúmeras rebeliões ocorreram justamente por causa da péssima alimentação e porque não tinha alimentação suficiente para matar a fome dos reeducandos”, sustentou.